ACADEMIA MIDIÁTICA

26 junho 2006

CRÔNICA DA SEMANA

A CARA-METADE


Roberto, um grande amigo meu, está com um dilema daqueles. Indago. Ele põe a mão no queixo fica em silêncio por uns três ou quatro minutos e diz:
- “Sabe eu vou fazer quatro anos de casado.”
Fico feliz. Digo que é muito bom. Quanta gente não passa nem um mês. Quantos casamentos são verdadeiros golpes na vida de uma pessoa. Quanta gente vive só ou mal acompanhada.
Disparei :
-Parabéns ! Mas ele não se animou. Continuou ensimesmado. E eu quis saber o por quê. Roberto diz que queria um romance contínuo.
Eu disse:
- Besteira ! As relações não são somente brancas nuvens. Têm que ter raios e trovoadas. Ele respondeu que não são nuvens brancas, nem raios ou trovoadas... é uma forma de estio. E continua que queria que cada dia para ele fosse como naquele livro, O Barão nas Árvores, do Ítalo Calvino, onde Cosme o protagonista, ao se encontrar com seu grande amor, Viola, tem o seguinte comentário: “Conheceram-se. Ele a conheceu e a si próprio, pois na verdade jamais soubera quem fosse. E ela conheceu e a si própria, pois, mesmo já se conhecendo, nunca pudera se reconhecer assim.”
Fiquei pasma, meu amigo, você quer algo como Romeu e Julieta, Tristão e Isolda, Cleo e Daniel, Sansão e Dalila. Quer as nuvens, o êxtase, o céu... a terra e tudo quanto é anjo e arcanjo juntos. Quer o impossível.
Roberto não se alterou e disparou :
- Eu quero o impossível. Porque o amor por si só já é impossível e conseguimos chegar até ele. Nos adaptarmos a outra pessoa, mudamos o cardápio, hábitos, programas, estilo de vida quando há paixão há prazer em tornar-se adaptável ao outro.
Eu contra argumentei dizendo que ele então se anulou . Que passou quatro anos tentando ser outra pessoa e agora a voz da consciência o chamava a luz da verdade. Nada disso, ele se agitou e disse que é o ponto onde ele fala que quer o romance de Calvino onde antes ele jamais saberia quem ele era e partir dela ele sabe quem é. Disse:
- Sou parte dela. Sou ela.
Mas ela não vê as coisas dessa maneira, disse eu, e você vai ter que entender ou desistir. Roberto então começou a despejar mais frases sem sentido.
Quero a volta dos bilhetes, dos cartões, dos recadinhos, dos telefonemas no meio do trabalho só para dizer eu te amo e voltar ao serviço. Quero o abraço do encontro no fim de tarde. Quero os pezinhos se encontrado por baixo da mesa. Quero o pôr-do-sol. Quero pegar a estrada. Quero ser acordado com um bom dia meu amor. Quero poder amar, simplesmente quero poder amar. Só isso.
Contemporizei. Mas isso aí não é ela. Isso aí é você! Você é assim e não ela. Você quer que ela seja como você. Falei e sacudi seus ombros. Mas ele disse que esse era o problema.
- “Eu quero que ela também seja eu. Porque durante um bom tempo ela quis sê-lo e muitas vezes conseguiu. Agora eu não me encontro porque ela se perdeu. Depois que disse isso ele voltou ao seu silêncio característico, colocou o CD dos Paralamas e começou a ouvir Capitão de Indústria.
Resolvi deixá-lo só a procura de sua cara-metade.

17 Comments:

At 11:35 da manhã, Anonymous Anónimo said...

conheço bem essa história....né!?!?!

Roberto está mais que certo...

Nada melhor que acordar com um "bom dia meu amor" ou receber ligações altas horas da madrugada só pra dizer: "liguei só pra escutar sua voz e dizer que te amo", e ficar falando besteira a madrugada todinha e ao amanhecer vendo o sol nascer, dizer:" esse sol é pra você meu amor, bom dia!"... ligar do nada perguntando se pode vê-la a tarde só pra ver aquele belo sorriso estampado no rosto e dizer: "te adoro" ... ...abraços gostosos, beijos suculentos, olhares maliciosos...ah...isso faz falta....muita falta...mas fazer o que né?! nada é como a gente deseja...


beijos....

 
At 1:46 da tarde, Anonymous Anónimo said...

A esposa do Roberto q me perdoe e escooonda este homem!
Jacqueline, manda um clone do Roberto pra mim.
Lorenna Ramalho

 
At 2:31 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Pobre Roberto,
Acho que ele sente saudades é da juventude e da forma como tudo nos afeta intensamente nesse período. Sou casado a sete anos e tenho consciência que hoje vivo no lucro de tanto tudo que já fomos até agora. E como quem vive de rendas, espalho-me tranquilamente consciente de que esses mesmos detalhes que fazem falta ao Roberto já existiram, já fazem parte do todo que construímos e lembrá-los já é mais do que suficiente. Saudade até que assim é bom, pro cabra se convencer que é feliz sem saber.

 
At 4:37 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Ahh..como seria bom eternizar esses sentimentos expostos pelo Roberto. Mas não se iluda amigo, existe beleza e afeto também em nossas minguadas "rotinas" de casados.Acho que já é hora de tranformar todo esse "fogo" em uma brasa amiga e companheira...na verdade não deixamos de nos apaixonar,apenas transformamos em amor e companheirismo aquela paixão arrebatadora de outrora. Lindo texto tia Jac!!!!..Um xerão

 
At 7:36 da tarde, Blogger Alícia Melo said...

Roberto quer o que todos queremos.
Quem não entende Roberto?
=*
Beijo Jac.

 
At 4:34 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Concordo com o Américo! Paixão é muito bom... mas passa. O que fica e que vale a pena é o amor, com a sua calma, com seus altos e baixos, com aquela felicidade morninha que deixa a gente assim... leve. O resto é perfumaria.

 
At 1:54 da tarde, Anonymous Anónimo said...

O que não significa, é claro, que a gente não possa ferver esse mesmo amor a nosso gosto...

 
At 1:48 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Uma história muito interessante porque mostra o que muita gente sente depois de algum tempo d casado...
Texto muito bom.

 
At 11:40 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Muito bom, mesmo , uma cronica bastante trabalhando com uma capacidade sinonimica incrivel, muito maneiro, com uso do jogo de ideias ``conceptismo`` muito legal está de parabens voçÇe viu!

 
At 11:50 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Jacqueline, todo mundo é um pouco Roberto.
Todo mundo é um pouco a esposa do Roberto.
Todo mundo se apaixona e desapaixona. Sofre e faz sofrer. Todo mundo um dia acreditou ou ainda acredita que existe amor esterno. E quem nunca quis um amor assim? Não morrer, mas viver de amor. Temperamental... as vezes lúdico... outras, alucinógeno. Quem não quer ser feliz. Quem? Quem não adoraria prorrogar o orgasmo um pouquinho mais? Ou o tamanho da bola de sorvete? Talvez até o número de olhares apaixonados que recebemos durante o dia... Cada um tem algo em particular que o deixa feliz. Pena quando essa particularidade depende de outra pessoa, e quase sempre é assim!!! Seria quase como dizer que é impossível ser feliz sozinho. E é? Não sei. Mas o Roberto que existe aquí dentro, diz que não, e toda hora grita, para ninguém, que quer um carinho! Quer ser feliz! E acaba se apaixonando por sí mesmo, e sempre termina só! Certo mesmo, está o Roberto, que sofre por um amor real.

Jacque... você é a mulher!!!
Lindo, o seu texto!
Desculpa a minha viagem!

Daniel Paixão

 
At 8:39 da manhã, Anonymous Anónimo said...

mas o que dizer
dos sentimentos...na verdade, os afetos são sentimentos, estados de ânimo
que, além de se diferenciarem das emoções por seu carater positivo e
irradiante, diferem tambem, por sua continuidade e duração. A emoção, já é
diferente....é súbita, rápida, e efêmera, enquanto o afeto é uma emoção
prolongada que nasce e morre lentamente, pois seu carater fundamental é o
da continuidade da estabilidade e de maior profundidade em relação à emoção.
Sem que o percebamos, nosso sentimento é frequentemente ofuscado pela névoa
dos estados emotivos, condicionados por impulsos instintivos. O verdadeiro
"amar" é conseguido somente com o esforço e apenas em momentos de
concentração voluntaria. vivemos isso de fato, quando nossa mente se desvincula
por completo de influencias emocionais e instintivas, quando conseguimos nos
focalizar na nossa vontade e racionalizar com imparcilalidade e lucidez. Quantas vezes nós, golpeados pela provação e sofrimento, reagimos,
mergulhando na vida exterior com febril ansiedade, procurando esquecer a
dor, as proprias vontades, sem saber quão é nociva essa evasão, uma vez
que o sofrimento não enfrentado, não suportado e, finalmente, não superado, permanece em nosso subconsciente e, como passar do
tempo, cresce como um tumor escondido, que vai minando a sua saude emocional até que
um dia compromete todo seu bem estar, e sua felicidade. Somos seres
influenciaveis, sugestionaveis, desprovidos de autodominío e de vontade,
sempre incosntantes e volúveis, exatamente por não termos ainda encontrado o
"centro" de nossa consciencia sentimental.
Michel Franciss

 
At 8:33 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Nossa eu fiquei ate sem palavras, mas tipo, será o destino de cada um de nos procurar pela cara-metade? sim! felizmente ou infelizmente! e a busca naum eh facil
parabens pelo texto

 
At 3:01 da manhã, Blogger Arianne Pirajá. said...

e eu aqui, batendo o pé:
- seja eu, meu amor. senão não saberei como te amar!
e o pensamento lá longe, tentando entender se seria um excesso ou uma falta de amor-próprio. ou talvez não seja nada, pois desses assuntos de amor o pensamento deve manter mesmo é distância, posto que é loucura.
e pôr razão na loucura é mexer demais nos cálculos amorosos. é preciso esperar, pois certas loucuras inerentes e necessárias costumam acabar com uma razão indefinida e incontestável.
fazer o quê? deixa ser.

 
At 7:17 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Parabéns...escrevendo como sempre com muita sabedoria.

 
At 7:18 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Alguém do passado.

 
At 10:15 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Roberto existe e é de carne e osso. e acredite! está bem do ladinho.
Você é d+++++++++++++++++++++++++++.

 
At 1:29 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Obrigado por intiresnuyu iformatsiyu

 

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