ACADEMIA MIDIÁTICA

22 maio 2007

CRÔNICA DA SEMANA - para Samária

PARA AMORA COM CARINHO

Por: Jacqueline Dourado

Ainda não tive tempo de vê-la. Também sua tia Ângela fez o favor de esquecer-se de me avisar. Agora que eu lembrei para ela que você tinha nascido vai ficar mais fácil. Quero em primeiro lugar desejar a você àquilo que desejamos aos amigos: paz. Seja da paz. Seja bem-vinda.

Ainda não nos conhecemos. Mas conheço muito bem sua mãe. Conheço muito. Passamos quatro ou cinco anos de nossas vidas trocando idéias, ideais, piadas, críticas, sorrisos, fotografias, lanches, Jurgen Habermas e muita felicidade travestida da velha e boa persuasão Aristotélica.

Um dia sua mãe vai sentar ao seu lado e te contar tudo isso muito diretinho. Vai contar que em plena universidade fundamos uma seita das Adoradoras do Sal só para combatemos as C. Doce que estavam proliferando pelo Campus. Vai dizer o quanto que era bom arriscar-se em ficar de pé dentro do ônibus da empresa Transcol para brincarmos de surfistas. Era uma competição maravilhosa saber qual das duas tentava se segurar primeiro. Tudo isso sob o olhar crítico de Ângela, é claro.

Vai ter uma tarde em que sua mãe olhando a cidade em que nasceu vai dizer que um dia saímos para procurar uma sereia que vivia encantada dentro de um poço. Essa lenda surgiu numa mesa de café da manhã e prontamente fomos fotografar. Na hora de subir no muro o meu tombo teve muito mais emoção. Como teve emoção, também, escalarmos a antena de televisão e a caixa d água do BEP de Piripiri. Tudo por uma boa imagem. Um sonho de vida. Você vai saber ainda que um lobisomem uivou uma madrugada inteirinha depois da Festa da Sucata. Nem queira saber quem estava na pele do animal.

É assim, minha querida Amora, que intercalamos essas histórias com aquela saborosa frase “lembra naquele tempo”... E é assim que o tempo passa nas curvas e nas retas da vida da gente. Um tempo de se correr perigo para rir depois e um tempo eu que rimos diante do perigo.

Um tempo de atirar de chumbinhos nas festas da padroeira e sentir o cheiro dos vidrinhos de penicilina sendo quebrados, de dormir às sete da manhã, de comer tilápia recheada de filosofia de mesa, de andar de bicicleta, de dançar a música do faraó, de sonhar com um bom trabalho que honre o que estudamos. De desvendar mistérios, de ser claramente uma pessoa com dúvidas.

Um tempo em que as pessoas vão ficando distantes dos nossos olhos até que às perdemos de vista, mas os corações continuam juntos. Batendo ritmados até o próximo encontro. As pessoas mudam, se mudam , retornam e tornam a mudar como numa dança de roda. Para crescer tem que ter certo desencontro e quando ele surge é porque todos os encontros todos se realizaram e cada um precisa buscar um rumo de acordo com o vento de seu barco. Assim é a vida e é assim que ela continua.

Enquanto não vou dar-lhe um beijo pessoalmente, eu gostaria de me despedir desejando a você bons amigos, já que não preciso desejar boa família porque essa você já tem. Nem desejar que você seja extremamente bem criada porque disso eu tenho certeza. Mas então volto aos amigos. Conquiste-os, encontre-os, ouça-os, ajude-os, critique-os. Seja sempre você assim como é sua mãe.

Não tenha medo de expor-se, mas tenha a discrição dos sábios. Acima de tudo lute com todas as suas forças por um lugar à sombra e ao sol. Lute para que seu coraçãozinho seja sempre mantido aquecido. Nunca esqueça a palavra VIDA.

E fica aqui um presente para você em forma de um beijo. Um beijo com sabor de Amora.

17 maio 2007

CRÔNICA

CRÔNICA - ANINHA E LEONARDO


Vou contar hoje a história de Aninha e Leonardo. Aninha foi resgatada num esgoto próximo ao mercado da Piçarra com mais dois irmãos. Leonardo sobreviveu quase um mês no forro da laje de uma casa sem comer quando foi abandonado pela mãe. Uma semana depois de encontrada, mais dois irmãos seus foram descobertos e doados para uma família.
Aninha depois de resgatada foi banhada com os dois irmãos e tiveram que ficar escondidos entre tijolos apara escapar das vassouradas de quem não era simpática a presença deles. Já o Leonardo esquelético, devorava leite, carne de frango e clara de ovo. Ainda jovem teve que passar pelo pânico de enfrentar a ira que o Bolinha tinha deste tipo de espécie. Com o tempo ficaram amigos, mas agora andam meio afastados por conta da presença do Bob o mais novo e quase amigo do Bolinha, porém atroz inimigo do Leonardo. Leonardo não esquenta muito porque acha o Bob meio sem personalidade. Ele atende por qualquer nome que o chamarem. Outro dia disseram “TED” ele atendeu rápido, “JONH”, ele correu, logo disseram que ele seria a reencarnação dos irmãos Kennedy.
Aninha tinha tanta fome que se tremia toda quando ia comer. Hoje já adulta pratica o mesmo expediente e consegue chamar a atenção de suas aias.
Já o Léo desenvolveu uma virilidade precoce e não poupava nem o travesseiro de sua guardiã. Era um taradinho. Mas hoje tem estado mais manso só come mesmo o sofá embora tenha desenvolvido um miado quase compreensível na língua portuguesa.
Aninha perdeu os dois irmãos de forma drástica. Uma coelha achou que os pequenos eram culpados pela morte de seus filhotes e passou a unha neles. Um foi partido quase ao meio. Costurado sobreviveu oito dias. No nono dia... pimba. Bateu as patas.
Leonardo passou a se envolver com brigas e a chegar de olho roxo e rabo murcho pela manhã, foi castrado para ver se pegava um peso e deixava as gatas em paz. Aninha também não tem mais ovários.
Aninha e Leonardo nunca se viram, namoraram ou coisa parecida, mas ambos são sobreviventes aos milhões de gatinhos abandonados em beira de esgoto ou jogados à própria sorte. Perfeitamente adaptados a nova forma de vida eles são gatos que adoram um carinho, mas só quando procuram.
Adoram os donos desde que providos de alimentos e não podem ver um carambolo dando sopa. Ficam num ritual com a patinha e quando o bichinho tenta se desvencilhar eles jogam o bicho para cima, mordem a cabeça deles, fazem cara de amargo e botam a patinha peluda em cima dos desgraçados. O bicho fica ali estressado e se fingindo de morto. Quando tenta de novo é arremessado novamente. Até que finalmente eles morrem e os gatos se afastam para comer algo melhor porque carambolo só serve mesmo, para eles, para certa e cruel diversão.
Assim vivem Léo e Aninha que entre o um prato e outro caem em sono profundo. Um no travesseiro da dona ou no sofá da sala a outra detrás do freezer ou em cima da caixa d`água. Eita vidinha mais ou menos.
Qualquer dia eu conto sobre a gata cega, o que mia fino e a de olhos de duas cores.